Dados mostram que privatização não melhora Ideb de escolas

Pesquisei o que aconteceu com escolas que fizeram parceria com iniciativa privada e não foi possível encontrar qualquer melhora significativa nas avaliações

Meus estudos realizados entre 2012 e 2016 foram sobre a privatização da educação pública. Não é algo novo. Ao analisar a gestão educacional de 109 secretarias municipais brasileiras, constatei que 74 tinham alguma parceria público-privada. Isso se deu com aval do governo federal. À época, para que as redes de ensino dos municípios tivessem direito a um financiamento do Fundescola, programa ligado ao Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), seria necessário que a secretaria municipal da educação firmasse assinatura com o termo do Plano de Metas do Compromisso Todos pela Educação

Para quem não lembra, o Todos pela Educação é uma Organização Social criada em 2006 por grandes empresas nacionais e transnacionais. De acordo com o site, a equipe gestora do movimento é formada por empresários dos grupos Gerdau, Suzano, Banco Itaú, Banco Bradesco, Instituto Unibanco, Organizações Globo e o Instituto Ayrton Senna, entre outros. “O Todos pela Educação é um movimento financiado exclusivamente pela iniciativa privada, que congrega sociedade civil organizada, educadores e gestores públicos e que tem como objetivo comum contribuir para que o Brasil garanta a todas as crianças e jovens o direito à Educação Básica de qualidade.”

A principal justificativa para a assinatura do termo de compromisso era a melhoria do Ideb das escolas. O que verifiquei é que a diferença entre o Ideb das escolas que firmaram parcerias daquelas que permaneceram totalmente públicas – e sem aquele dinheiro – é irrisória. Observe o gráfico abaixo com a média do Ideb entre 2005 e 2013, que analisou as experiências de planejamento e gestão de 109 secretarias municipais. Vale lembrar que o Ideb corresponde aos Anos Iniciais do Ensino Fundamental (1º ao 5º ano), de responsabilidade municipal (CORRÊA, 2016, p.356).

Chamei de PPCP as secretarias de educação que firmaram parcerias com órgãos públicos e PPPE com empresas privadas. Vejam que as PPCPs já iniciam 2005 com o maior Ideb, e assim o mantêm até 2013. Isso significa que parcerias com secretarias de saúde, Ministério de Desenvolvimento Agrário (à época) e outros órgãos públicos encontrados na pesquisa melhoram o Ideb. A diferença entre as notas demonstrada pelas duas casas decimais é mínima e não evidencia que um tipo de parceria poderia ter influência sobre o Ideb.

Embora o PL 345/2024 do governo do Paraná, que obriga 200 escolas a serem administradas por empresas privadas, não cite a melhoria do Ideb, mas sim a desburocratização das funções da direção escolar, o material de divulgação enviado às escolas aponta isso. 

A parceria público-privada significa o afastamento do Estado da oferta direta da educação como seu dever, e direito dos cidadãos, ambos previstos constitucionalmente no artigo 205. Como dito anteriormente, a ideia não é nova e vem na esteira do neoliberalismo que propaga a ineficiência e o inchaço do Estado e vê, na Terceira Via, a possibilidade de sanar o problema da educação nos países em desenvolvimento. 

O que a pesquisa constatou é que a eficiência e a eficácia desejadas para a gestão das escolas parceiras se deram na perspectiva do monitoramento e do controle das ações escolares. O diretor permaneceu sendo o responsável último e o culpado primeiro pelos resultados da escola. O gerencialismo se evidenciou nas experiências com o aumento da responsabilidade dos sujeitos educacionais sem investimento, da gestão de mercado repassada à escola, da competitividade e da redução de custos.

O discurso da ineficiência estatal, propagado já em 1996 por Bresser-Pereira, como justificativa para as primeiras iniciativas de parceria público-privada, esconde as intenções de desresponsabilização e de transferência do recurso público para o privado.

O que deve estar claro é que o Estado não está ausente. O que está ausente é o caráter público do Estado. Por isso, a necessária resistência à privatização da educação. Inclusive, a pesquisa demonstrou que as secretarias que resistiram ao programa gerencial eram as únicas que citavam a expressão gestão democrática em seus documentos, enquanto as demais iam para a gestão gerencial. 

Finalizo essa reflexão com um texto de um dos maiores educadores brasileiros, Anísio Teixeira, que já nos anos de 1930 propagava que a administração das escolas deveria ser realizada por professores e não burocratas. Ele disse: “Existirá uma democracia, no Brasil, no dia em que se montar no País a máquina que prepara as democracias. Essa máquina é a da escola pública.”

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