Planejamento de longo prazo é um avanço, mas gestão Ratinho podia ser mais audaciosa

Professores de Economia analisam o plano "Rota do Progesso", lançado pelo Governo do Paraná

Hugo Iasco-Pereira, Professor do Departamento de Economia da UFPR
João Basílio Pereima Neto, Professor do Departamento de Economia da UFPR
Guilherme Jonas Costa da Silva, Professor do Insitituto de Economia da UFU

Recentemente, o Governo do Paraná lançou o programa “Rota do Progresso”. O objetivo desta política pública é fomentar ações em diversos eixos para estimular o crescimento e o desenvolvimento econômico de 80 municípios paranaenses, com investimentos previstos de R$ 2,1 bilhões, distribuídos em alguns setores. Os detalhes ainda não estão muito claros, pois o governo ainda não publicou o documento na íntegra.

Um aspecto notável do plano é o delineamento de municípios a partir de um critério técnico e objetivo – isto é, o Índice Ipardes de Desenvolvimento Municipal (IPDM). Os municípios escolhidos são aqueles com os menores valores deste indicador de desenvolvimento econômico e social.

O Programa prevê investimentos em alguns eixos, a saber: infraestrutura produtiva e social, transferência de crédito para novas atividades industriais, educação e formação de capital humano, e, por fim, um plano de desenvolvimento econômico a ser feito para cada uma destas cidades. Com efeito, o governo espera que o IPDM melhore como resultado destes investimentos.

Há muito que não se vê no Estado uma preocupação estratégica com o longo prazo. Portanto, o fato de se lançar um “Plano de desenvolvimento” já é uma notícia alvissareira, num país que abandonou as políticas de Estado, bem como as políticas industriais que impulsionem o ecossistema de inovação, açodado pelos problemas de curto prazo e pelas polarizações políticas. Ações como esta são fundamentais para o desenvolvimento produtivo do Paraná como um todo articulado setorial e espacialmente. Reconhecidamente, cabe aos governos a tarefa de planejar políticas para fomentar o surgimento de novas atividades produtivas e a geração de bons empregos, renda e, com isso, elevar os padrões de vida da população.

Ao estabelecer uma linha de corte, selecionando os 80 municípios mais atrasados em termos de IPDM, o plano, ao fim, parece ser mais um plano de redução de desigualdades intrarregionais (nos termos do IPDM), do que um plano mais amplo de desenvolvimento econômico, que potencialize as vocações e oportunidades de diversificação produtiva da economia paranaense. O que não lhe tira os méritos, haja vista que é de fato algo necessário no contexto atual de uma economia em transformação, com a agricultura e a indústria ganhando importância no Paraná.

Por outro lado, o programa “A Rota do Progresso” é uma aplicação de recursos que, naturalmente, se exaurirá nos próximos anos, quando as obras e incentivos previstos consumirem o montante alocado no orçamento e, na hipótese de sucesso, alcançarem seu propósito. No entanto, o programa, de alcance regional limitado, poderá ser o embrião de algo maior para o Paraná, podendo se transformar em uma “Política de Estado”, como já aconteceu entre os anos 1960 e 1990, durante o grande processo de industrialização. Neste sentido, “A Rota do Progresso” pode ser aperfeiçoada com a utilização de uma metodologia inovadora e moderna a partir da abordagem da complexidade econômica.

Um plano mais audacioso deveria ser voltado para o desenvolvimento de novos elos produtivos que são “estratégicos” e particulares para cada uma das regiões e municípios, explorando suas vocações locais, mas considerando aspectos regionais e setoriais mais amplos do que os previstos no programa “Rota do Progresso”.

O termo “estratégico” aqui é utilizado em dois sentidos. Primeiro, para denotar que algumas atividades produtivas são relativamente mais importantes, e mais fáceis de serem “ativadas” no processo de diversificação produtiva e geração de novos negócios. Estes setores são mais importante porque são mais complexos e possuem maior efeito sistêmico sobre outras partes da estrutura produtiva. À medida que a estrutura produtiva se torna mais diversificada, maior é acumulação de conhecimento produtivo da economia. Este é o motor do processo de desenvolvimento econômico.

Segundo, para indicar que o “caminho do desenvolvimento” é particular à cada localidade, em específico, ao tipo de conhecimento produtivo que já existente em cada município. A diversificação produtiva, ou ganhos de complexidade econômica, se dá em direção a atividades econômicas não muito distantes das que já existem na economia local. Por exemplo, não é de se esperar que uma economia produtora de soja passe a produzir carros. Na verdade, a diversificação produtiva deve ser feita em direção a setores com alguma proximidade daqueles que produzem soja (como complexos industriais de beneficiamento da soja etc). Neste sentido, a estrutura produtiva deve ir aos poucos, passo-a-passo, incorporando novos conhecimentos produtivos. Por exemplo, a partir do surgimento de um complexo industrial de beneficiamento da soja, a economia municipal pode se diversificar em direção à setores industriais alimentícios, e depois destes para outros novos produtos que aparecerão no radar, e assim sucessivamente.

Estimular a diversificação da estrutura produtiva em direção a produtos mais complexos é desejável. A literatura moderna sobre desenvolvimento econômico revela que é esta mudança estrutural que explica o diferencial de taxas de crescimento entre economias que possuem o conhecimento necessário para produzi-los das que não possuem. Assim, identificar quais são os setores e produtos que devem ser fomentados por uma política pública voltada à diversificação produtiva é fundamental para o desenvolvimento de uma economia que opera com restrição de recursos.

Por isso, argumentamos que o sucesso da “Rota do Progresso” está associado, em partes, com a identificação dos setores com maior complexidade econômica e das atividades econômicas “mais próximas” em cada um dos 80 municípios em questão e, por outro lado, com a capacidade de reverberação destes investimentos ao longo do teritório paranaense e de ativação de novos elos da cadeia produtiva. Não obstante, entendemos que o Paraná, pelo seu histórico, pelas competências acumuladas, pela sua posição geográfica, pelas características de solo, fronteiras internacionais e conformação de centros urbanos dinâmicos e articulados, tem condições de realizar um planejamento econômico mais ambicioso, transformando a “Rota do Progresso” em um plano de desenvolvimento econômico mais amplo em termos setoriais e regionais.

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1 comentário em “Planejamento de longo prazo é um avanço, mas gestão Ratinho podia ser mais audaciosa”

  1. A modernização aqui no Paraná é função de transferir recurso público para bases econômicas e políticas estabelecidas e cupinchas. Inovar é secundário. Veja a modernização da educação, transferiu a lógica burra das redes sociais onde a direita paranaense nada de braçada, para um plataformização com os empresários amigos do Governador.

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