A antipolítica não compareceu ao debate

Parece que ao final do debate o “sistema” triunfou sobre o “antissistema”. Que alívio. Sim, o sistema merece críticas, mas jamais pode ser destruído

Sem qualquer expectativa, assisti ontem ao debate do segundo turno para prefeitura de Curitiba. Confesso que fiquei aliviado. Explico.

Ao testemunhar nos últimos meses uma onda de ataques ao estado democrático de direito e ao “sistema”, imaginei que poucas propostas seriam postas à mesa. Mas não. O que assisti foi justamente o contrário: um festival de promessas que reforçam da importância do Estado e consequentemente a importância do sistema político.

Reproduzo, aqui, algumas coisas que ainda estão em minha memória:

“Vou construir mais creches; vou ampliar o número de vagas nos hospitais; vou melhorar o transporte público; vou asfaltar mais ruas; vou ampliar o aparato de segurança para as mulheres; vou investir na capacitação dos jovens para o mercado de trabalho; vou ampliar o número de habitações populares; vou oferecer ônibus gratuito aos domingos; vou criar uma rede de apoio com médicos e psicólogos para moradores de rua; vou ampliar os restaurantes populares para combater a fome; vou desenvolver os produtores locais para oferecer melhor alimentação para nossas crianças” entre outras.

Percebem como essas propostas são exatamente o oposto da ausência de Estado? Percebem como eles valorizam a política como instrumento transformador, promotor de igualdade e civilidade?

Nas propostas o Estado se faz presente em uma infinidade de situações que vão muito além da tríade “saúde, segurança educação”. Dá onde vem dinheiro para pagar tudo isso? Dos nossos tão odiados impostos, claro. Por que, então, o político ANTISSISTEMA não propõe extinguir todos os impostos municipais e junto com eles extinguir também todos os serviços públicos?

Seria algo mais ou menos assim: “vou reduzir o número de creches; não vou tapar buracos nem asfaltar ruas; vou fechar hospitais e extinguir os pronto-socorros porque custam muito ao cidadão; não vou amparar moradores de rua, eles estão lá porque querem; não vou ampliar o transporte público; não me importo com a segurança das mulheres nem com a formação técnica dos adolescentes; não vou oferecer o contraturno nas escolas nem construir quadras poliesportivas”.

Será que o eleitor, do outro lado da tela, no conforto do seu sofá, entraria em êxtase com esse pacote “antipropostas” em nome da diminuição de gastos públicos? De jeito nenhum.

E por falar em verbas públicas… Boa parte dos recursos aplicados em uma cidade é proveniente do Governo Federal, o chamado FPM (Fundo de Participação dos Municípios). Vi no debate que a esquerda ainda é um fantasma que assombra as duas candidaturas, uma batata quente que jogam de lá para cá e que ninguém quer encostar. Me perdoem pela ingenuidade, mas caso eleitos, aceitarão dinheiro da esquerda federal ou tudo que vem da esquerda é inaceitável? Num próximo debate eu realmente gostaria de ouvir como serão investidas as verbas vindas de Brasília.

Em dado momento a candidata Cristina trouxe a público o currículo de Ratinho Junior: “ele foi sonoplasta do pai e hoje é governador”. Parecia uma crítica, um deboche à falta de formação e experiencia profissional do atual governador. Mas não. Logo veio a correção. Aquilo era um elogio, o apontamento de uma virtude, uma maneira de dizer que ela, mesmo sendo jornalista (sem ter gerenciado nada na vida) pode ser uma boa gestora como ele. Ratinho também foi poupado das críticas que a candidata fez ao PSD. Mesmo depois de dizer que a sigla faz parte da “esquerda comunista” ela voltou a elogiar o governador, que pertence ao partido. Tá arrasando, hein, Carlos Massa?!

Trânsito em julgado? Pois é. Também foi tema. Pimentel trouxe a notícia de que o vice de Cristina foi condenado em segunda instância por estelionato. Condenado. A pergunta que faltou: “você é a favor de prisão após condenação em segunda instância ou concorda com o sistema jurídico tal qual ele é?

E o conservadorismo, apareceu? Sim. Apareceu também para abraçar o virtuosismo do sistema: “sou conservadora, vou conservar aquilo que está dando certo”.

Enfim, parece que ao final do debate o “SISTEMA” triunfou sobre o “ANTISSISTEMA”. Que alívio. Sim, o sistema merece críticas, mas jamais pode ser destruído.

Não sou jornalista nem cientista político. Meu lugar de fala é de um eleitor que, como qualquer outro, manifesta opinião sobre a política brasileira. Curitibana, no caso. Dizem que, numa democracia, opiniões são sempre bem-vindas.

De nada.

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