O terremoto Renato Freitas mostra os limites da oposição de fraque e cartola

Renato Freitas
Disputa entre Renato e bancada petista mostra dois modelos diferentes de oposição

Chegou a hora em que a atuação de Renato Freitas na Assembleia Legislativa começou a incomodar também o PT, partido a que o deputado está filiado desde que saiu do PSol, em 2018. A reclamação veio a público nesta semana, depois que Renato disse na tribuna que seus colegas de oposição preferiram não assinar junto com ele um pedido de cassação do presidente de Assembleia Legislativa, Ademar Traiano (PSD).

A história é a seguinte. Renato Freitas, que sozinho conseguiu encurralar Traiano e deixá-lo à beira da renúncia, fez um documento formal pedindo a cassação do presidente por quebra de decoro parlamentar. Antes de protocolar, mandou num grupo de WhatsApp dos deputados e disse que os outros podiam assinar. Um único deputado, Goura (PDT), teria se manifestado pedindo para conversar sobre o caso na semana seguinte. Ninguém disse mais nada e Renato, sem esperar, protocolou tudo sozinho no Conselho de Ética.

Quando Renato disse na tribuna (e falou também para a imprensa) que os colegas o deixaram sozinho na luta contra Traiano, os outros oposicionistas se incomodaram profundamente. Até porque, segundo eles, a militância pegou no pé. E aí veio a reação. Os deputados falaram para a imprensa que não era nada disso, deram sua versão dos fatos (foi tudo muito em cima,não houve articulação, não custava esperar a segunda-feira…) e, mais grave, soltaram uma nota em que deixam clara a divisão interna.

Dá para olhar para essa história de diversos ângulos. Um deles dá razão para os petistas que se incomodaram: Renato Freitas, de fato, não é o tipo do cara que joga junto com o partido. Tem uma atuação meio à margem do petismo oficial – e por vezes nem parece tão bem-vindo no partido. E o pessoal acha que ele devia ser mais parceiro.

Mas… existe pelo menos um outro ponto de vista. Quando querem que Renato entre no ritmo do partido, faça as coisas coletivamente, os demais deputados parecem não entender a essência do que é o trabalho de Renato. Ele não está ali pelos mesmos motivos deles, nem tem os mesmos interesses. Querer colocar ele no jogo tradicional é como tentar usar uma coleira num gato.

O petismo clássico faz uma oposição moderada na Assembleia (e eu sei que os deputados que estiverem lendo isso jamais concordarão). Jogam dentro do regimento, apresentam seus requerimentos, fazem contestações da tribuna. Cuidam para jamais ultrapassar os limites da civilidade – afinal, se eles forem vistos como bárbaros que não sabem jogar dentro das regras e com quem é impossível negociar não vão aprovar mais nada. E talvez seus mandatos fiquem sem muito sentido.

Dá para entender essa lógica. É a lógica dos avanços pontuais, da mudança gradual, da tentativa de desgastar o poder aos poucos. De mostrar o que está errado sem precisar para isso cometer nenhuma ação tresloucada.

Mas isso também tem seus limites.

Em oito anos de Beto Richa e cinco de Ratinho Jr., a oposição parlamentar conseguiu avanços, claro. Mas ao fim e ao cabo Richa e Ratinho governaram passando por cima de tudo (como mostra o 29 de abril, num exemplo radical). Traiano, então, nem se fala. Engoliu todos a ponto de obter a quinta eleição para a Presidência com todos os 54 votos (incluindo o do próprio Renato).

Se tem alguém que botou medo nos governos de Beto e Ratinho não foi a oposição parlamentar. Foram a APP e os demais sindicatos, foi o MST, foram os movimentos sociais que tomaram o plenário quando Richa decidiu aprovar tudo na marra.

Renato tem muito mais a ver com esse tipo de movimento. Porque ele não está nem aí para o seu mandato, na verdade. A sua atuação é kamikaze: se para explodir o inimigo ele precisar ir junto, Renato se explode. Se precisar ser visto como bárbaro, ele não está nem aí. Se precisar jogar sozinho, ele joga.

Na cabeça dele não faz o menor sentido esperar uma reunião com um grupo de parlamentares para decidir pedir a cabeça de Traiano. Ele fez disso uma missão suicida, e numa jihad você não espera a reunião do grupo de zap para saber quando se explodir.

Talvez a oposição clássica tenha suas vantagens e acabe conquistando vitórias de grande monta (embora o passado recente não indique isso). Mas existe outra hipótese: a de que o pessoal que faz essa oposição mais comedida, de fraque e cartola, possa aprender algo com quem vem de outro mundo e vem tendo um resultado muito mais visível na luta contra os poderes constituídos.

O bom mocismo da atuação parlamentar poderia ceder um pouco de espaço ao terremoto que, em poucos meses, conseguiu impor o maior golpe ao núcleo do poder que se instalou no Paraná há tanto tempo, e que ninguém tem conseguido sequer abalar pelo modelo tradicional de oposição.

Talvez, para encurtar a conversa, seja hora de injetar um pouco de adrenalina na veia de nossa oposição. Porque de discursos longos que não mudam nada estamos todos meio cansados.

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