Em sua estreia literária, Ana Johann fala sobre como é ser mulher no Brasil

Com a "História para matar a mulher boa", cineasta cria um romance de formação sobre provincianismo, alienação e a busca por uma vocação

O romance “História para matar a mulher boa” marca a estreia da cineasta Ana Johann na literatura. Como diretora e roteirista, ela realizou sete filmes. Destes, o mais recente é “A mesma parte de um homem” (2021), que venceu os prêmios de destaque feminino “Helena Ignez” no 24º Festival de Tiradentes, o de melhor roteiro original da Associação Brasileira de Autores Roteiristas e o de melhor filme no Riff Awards Roma.

Ana Johann lança “História para matar a mulher boa” na Livraria Arte & Letra, de Curitiba, na semana que vem – o evento será no sábado (29), às 11h.

Na entrevista a seguir, Ana Johann fala de suas influências e das circunstâncias em que escreveu o romance, além de dar argumentos para você ler o livro. “‘História para matar a mulher boa’ é também um retrato social de uma geração sobre o que é ser mulher no Brasil”, diz.

Sem se preocupar em dar uma sinopse, você diria que seu livro “História para matar a mulher boa” é sobre o quê?
É sobre Helena, uma mulher que está prestes a completar 33 anos e está enredada em um pântano de memórias da infância e incômodos do presente sem saber muito bem como chegou a esse lugar e o porquê não consegue realizar seus desejos pessoais. O sonho com uma serpente é um dispositivo disparador que irá movê-la nesta busca para pensar sobre si mesma e as raízes que a moldaram. 

Na literatura, quais são suas maiores influências? E como essas obras e autores influenciaram você?
É difícil eu falar de um autor ou uma autora específica até porque mergulho em muita coisa – vida, literatura, cinema, psicanálise, filosofia. Sempre me encantei por novelistas como Gabriel García Márquez e Isabel Allende, e não foi diferente quando me deparei com Elena Ferrante. Acredito que esses três escritores têm em comum a maneira de narrar e envolver o espectador em uma história profunda. Em “Crônica de uma morte anunciada”, de Gabriel García Márquez, você sabe que o personagem vai morrer, mas queremos saber como. Com o título do meu romance, não é diferente. A gente sabe que ela vai matar a mulher boa, mas mesmo assim existe um trajeto para isso. Para além da dramaturgia, esses autores habitam genuinamente seus universos e questões sociais e nisso também me aproximo deles. 

Você poderia falar um pouco sobre as circunstâncias em que escreveu o romance “História para matar a mulher boa”?
Eu vivi em uma vila rural na minha infância e adolescência e, de certa maneira, foi a literatura que trouxe outras possibilidades de vida para mim naquele lugar. Desde a adolescência nutri um lugar muito especial com a escrita e já ensaiava pequenas narrativas e sonhava em ser escritora. Em 1998 escolhi fazer jornalismo porque gostava de escrever, mas logo percebi que as disciplinas que mais gostava eram sociologia e filosofia, terminei e comecei uma busca. Escrevi muitas coisas que deixei guardadas e acabei encontrando no cinema um meio de expressão, primeiro no documentário e depois na ficção. Pois bem, veio a pandemia em 2020 e sempre tive esse sentimento de ser escritora, mas não tinha estreado na literatura e foi aí que resolvi me dar esse presente – escrever meu primeiro romance. 

Na sua opinião, ao escrever, qual é sua principal habilidade? E qual é sua maior dificuldade?
Eu sou muito ligada à dramaturgia até porque estudo isso há muitos anos, dou aula de roteiro e me encanta entender como as histórias são contadas. Acho que como se narra também se mostra muito de uma temática. Também sou muito ligada à construção de personagens, sempre gostei mais dos filmes existencialistas em que posso me grudar a uma pessoa, me sentir próxima dela. Nesse sentido, acredito que tenho uma certa facilidade de pensar na estrutura e também nos personagens. Talvez essas sejam as minhas melhores habilidades. Eu sou muito disciplinada e entendo que isso pode ser uma qualidade ou um defeito e comecei a refletir sobre. Sempre fui muito workaholic e me forçava a escrever mesmo com dor de cabeça. Hoje já não faço isso.  Tenho aprendido a deixar acumular dentro de mim para poder despejar no papel, não querer escrever todo dia. Outra dificuldade é que na escrita de um roteiro tudo é objetivo, criamos imagens. Na literatura também criamos imagens, mas são as palavras que nos guiam neste universo criado, então foi e é um aprendizado saber como ordenar isso em 256 páginas. 

Que argumento você usaria para convencer alguém a ler o seu livro?
“História para matar a mulher boa” é também um retrato social de uma geração sobre o que é ser mulher no Brasil e não só neste país. É um livro que versa sobre gênero e papéis, por isso pensei o livro como um lugar de escrutinar uma vida, mas também de ser um caminho possível para algumas mulheres reconhecerem o arquétipo da mulher boa que as habita para então fazerem uma curva, um rompimento… É um romance de formação onde dou conta de um arco que fala sobre infância da personagem, provincianismo, alienação, autoeducação e também uma busca de vocação. É também um romance de renascimento na medida em que, no final, ela não está mais integrada com o social, mas em consonância com o que ela é. 

Livro

“História para matar a mulher boa”, de Ana Johann. Editora Nós, 256 páginas, R$ 69. Lançamento sábado (29), às 11h, na Livraria Arte & Letra (Rua Desembargador Motta, 2.011 – Batel).

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