Para Laura Haddad, diretora de “Bull”, “a melhor montagem é sempre a próxima”

Em entrevista, a artista fala do novo espetáculo sobre relações tóxicas, assédio e bullying em ambientes de trabalho; a estreia é nesta quarta-feira (3)

“Bull”, do dramaturgo inglês Mike Bartlett com direção de Laura Haddad, estreia nesta quarta-feira (3) e segue em temporada até 14 de julho, no Miniguaíra. A peça de teatro chegou poucas vezes aos palcos brasileiros e, nesta primeira montagem Curitibana, a tradução é da escritora Luci Collin. Na assistência de direção, está Giovana de Liz, e o elenco é formado por Carolina Meinerz, George Sada, Rodrigo Ferrarini e Sidy Correa. 

O enredo de “Bull” apresenta três funcionários que aguardam o chefe decidir qual deles perderá o emprego, aborda as relações humanas em um ambiente de competição, apontando defeitos e fraquezas de cada um. Sem grandes reviravoltas ou redenções, em cena o público vê até onde o ser humano vai para manter uma posição “privilegiada”. (A palavra “bull” pode ser traduzida em português como touro, ou considerada uma abreviação dos termos em inglês bullshit (besteira) e bullying.) 

Alguns dias antes da entrada em cartaz, a diretora conseguiu um intervalo em sua agenda para conversar sobre o espetáculo, que inicialmente tinha um papel reservado para Enéas Lour. O artista faleceu em junho deste ano. 

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Laura Haddad

Com mais de 70 produções onde participou como atriz, diretora ou produtora (quando não acumulando mais de uma função), o que não faltam para a artista são prêmios. Chegando perto de 30 anos de carreira, na estante estão troféus do Gralha Azul na categoria atriz, direção, e de melhor espetáculos para suas produções, além do conquistado pelo filme “Casa Izabel”, em que atua e também é produtora, como grande vencedor do Cine PE, entre outros. Atualmente, ela também é a Coordenadora de Desenvolvimento da Economia da Cultura, na Secretaria da Cultura do Paraná.

Ao Plural, Laura Haddad falou sobre a importância de levar ao palco o tema apresentado na mais nova montagem teatral com a sua assinatura, que estreia nesta semana em Curitiba. Ela contou como se interessou pelo texto de “Bull”, por que a peça deve impressionar o público, e ainda como se reapaixona a cada novo trabalho. Leia a entrevista a seguir.

Como você chegou até o texto de “Bull”, escrito por Mike Bartlett? 

Um amigo me apresentou o texto do espetáculo “Bull”, mas eu já tinha lido outros desse dramaturgo.

Quais foram as principais motivações para escolher encenar esse texto?

A qualidade do texto e a temática do assédio e bullying nos ambientes de trabalho. Muito se fala do bullying e assédio nas escolas, mas em ambientes de trabalho é menos comum. 

Aqui é importante destacar a diferença entre bullying e assédio. É comum que esses termos sejam usados como sinônimos, e, de fato, existem semelhanças entre situações de assédio e de bullying. A principal delas é que ambas podem ser caracterizadas como atos de abuso de poder. A diferença, em teoria, é que atos de assédio estão sempre ligados a algum atributo social, seja classe, raça, gênero, idade da vítima ou posição de hierarquia na empresa. O bullying, por sua vez, pode incluir também agressões ligadas a características de personalidade da vítima e não precisa necessariamente estar ligado à alguma posição de poder social ou organizacional.

Bull estreou em 2013 no Reino Unido, depois fez temporada nos EUA. Mais de 10 anos se passaram, o que faz a peça ainda ser atual?

A temática das relações tóxicas no trabalho crescem a cada ano. Um estudo realizado na Universidade de Phoenix, nos EUA, estima que 75% dos funcionários americanos já foram vítimas de bullying em alguma etapa das suas carreiras profissionais. Outra pesquisa da Universidade de São Paulo (USP) de 2019 revelou que cerca de 42% dos brasileiros já foram vítimas de bullying no ambiente de trabalho em algum momento. Com a pandemia, e as sequelas que ela deixou na saúde mental de brasileiros e brasileiras, o Ministério Público do Trabalho (MPT) tem recebido cada vez mais denúncias e registros de casos de assédio moral, contribuindo para a conscientização e monitoramento dessa questão no país.

A dramaturgia tem a autoria de um inglês. Dá para dizer que o texto é universal?

A regionalidade do texto não é um problema, uma vez que a temática abordada é universal. Ela acontece em todos os lugares.

A tradução feita por Luci Collin já existia ou foi encomendada especialmente para a montagem curitibana do espetáculo? Foram necessárias muitas adaptações?

A tradução da Luci foi encomendada especialmente para esta montagem no início de 2020, mas por conta da pandemia, seguramos o processo até este ano. A Luci, além de uma amiga muito querida, tem todas as qualidades para traduzir este texto: além de ser tradutora, ela transita no universo das artes cênicas, é escritora das melhores – não poderia ter escolha melhor! 

Luci teve toda a liberdade para trabalhar na tradução do texto. As poucas adaptações feitas para a versão traduzida de “Bull” foram mais quanto a forma de falar do brasileiro, mas sem perder as referência do texto inglês como cidades, nomes, lugares, etc.

Você pretendia ter um dos personagens interpretados por Enéas Lour? Como foi a escolha do elenco final? 

Sim, o convite foi feito no início de 2024. Enéas faria o personagem Carter, o chefe implacável e intimidador. Infelizmente ele não conseguiu iniciar os ensaios pelos problemas de saúde que estava enfrentando. 

Elenco: Sidy Correa, Carolina Meinerz e Rodrigo Ferrarini, ao fundo George Sada. (Foto: Gus Benke/Divulgação.)

Depois, convidei artistas amigos, que admiro e com quem já trabalhei em outros projetos. Também levei em conta o perfil de cada um dos personagens na escalação do elenco.

“Bull” foi um sucesso em suas primeiras montagens (de 2013 a 2015), chegou a ganhar o prêmio de Melhor Peça no Theatre Awards. O que pode conquistar o público nesta primeira montagem curitibana do espetáculo? 

A peça é conhecida por sua intensidade psicológica, explorando as dinâmicas de poder, manipulação e competição entre colegas de trabalho. Bartlett constrói uma atmosfera de tensão crescente, criando um ambiente onde as emoções estão à flor da pele e as relações se tornam cada vez mais voláteis. O espetáculo brinda o público com ótimas performances do elenco, com papéis desafiadores exploram profundamente as motivações e os conflitos internos dos personagens. Embora situada em um contexto corporativo específico, “Bull” também aborda questões mais amplas sobre competição desenfreada, bullying e a natureza humana sob pressão, temas que ressoam na sociedade contemporânea.

Em suma, “Bull” de Mike Bartlett oferece uma experiência teatral intensa e provocativa que não apenas entretém, mas também desafia e estimula o pensamento crítico sobre temas universais da condição humana.

Para encerrar, vamos deixar “Bull” de lado e colocar a Laura no centro do palco, ou melhor do papo. Qual a montagem mais significativa em sua trajetória como artista e produtora?

Foram muitas montagens especiais, cada uma com uma particularidade pela qual me apaixonei. Eu sempre costumo dizer que a melhor montagem é sempre a próxima!

Espetáculo “Bull”

Onde: Miniauditório do Teatro Guaíra (Rua Amintas de Barros, S/N – Centro – Curitiba PR)
Quando: 03 a 14 de julho
Horário: Quarta a sábado às 19h e Domingo às 18h.
Ingresso: a partir de R$ 20, para meia-entrada (a bilheteria abrirá 1 hora antes de cada apresentação, compra somente no local com pagamento por PIX, ou cartões de débito e crédito).
Classificação: 12 anos | Duração 60 min.

Outras informações, aqui.

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