Prefeitura de Curitiba inaugura quadra com grama lilás para mulheres

Para especialista, pintura diferente reforça estereótipo de que mulheres são o “sexo frágil”

Nesta sexta-feira (05) a prefeitura de Curitiba inaugura uma quadra de futebol Society no Capão Raso. O local será voltado para que mulheres joguem e para isso ganhou um gramado lilás. A quadra fica na avenida Winston Churchill e terá jogo inaugural às 16h30 com atletas convidadas.

A qualidade do local será testada pelas jogadoras, mas a peculiaridade da cor do gramado chamou atenção de algumas delas. A reportagem do Plural entrou em contato com a assessoria de imprensa da Secretaria de Esporte, Lazer e Juventude da prefeitura de Curitiba para saber o porquê da cor diferente, mas a resposta foi que seria enviado um release com todas as informações após a inauguração.

Estereótipos

A prática do futebol por mulheres foi proibida para mulheres até 1979 no Brasil. Somente em 1983 houve a regulamentação, mas ainda está longe de ter atenção que o futebol masculino recebe.

Dados da Secretaria de Esporte de 2022 apontam que apenas 100, entre as mais de 1,3 mil crianças atendidas pelo programa Maestro da Bola, em parceria com o ex-jogador Ricardinho, são meninas.

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A falta de incentivo na infância das meninas provoca um efeito cascata: menos mulheres praticando o esporte, estereótipos de que não jogam futebol ou que, se jogam, o fazem de maneira diferente dos homens.

“O esporte é um espaço generificado, ou seja, um espaço que produz gênero. E nesse sentido, ele vai produzir imagens, ideias com relação aos dois gêneros, ou outros gêneros também, se for possível. Seja a ideia de papéis que homens podem cumprir ou mulheres podem cumprir uma ou outra tarefa e isso dá a noção de que há certos esportes que cabem para homens, há certos esportes que cabem para as mulheres”, explica Fernanda Ribeiro Haag, doutora em História Social pela USP e pesquisadora do futebol feminino.

Cor-de-rosa

A iniciativa da prefeitura de Curitiba em criar uma quadra lilás (ou cor-de-rosa) para mulheres reforça o imaginário social que associa o feminino necessariamente ao “delicado” e, por consequência, contraposto ao “competitivo”, que é uma qualidade em meios esportivos.

“[a quadra lilás] acaba reforçando determinados estereótipos de gênero: de que mulheres podem jogar bola se comportarem de determinada maneira; se elas forem femininas. As mulheres podem gostar de rosa, tem muita gente que gosta de rosa e está bem longe desse estereótipo, mas é preciso complexificar as coisas e lembrar que existe toda uma construção social em torno disso. Então, a partir do momento que você coloca uma quadra rosa, você associa essa ideia”, critica a pesquisadora.

O reforço de estereótipos de gênero em iniciativas públicas acontece com frequência. Em 2018, por exemplo, a prefeitura de Curitiba e o Governo do Paraná colocaram cílios postiços nos semáforos da cidade em virtude do Dia da Mulher. À época houve críticas e o apontamento para que mais mulheres deveriam ocupar espaços de poder.

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No caso da Secretaria de Esportes de Curitiba, o titular da pasta é Carlos Eduardo Pijak Jr. (a reportagem pediu uma entrevista com ele sobre a quadra lilás, mas a assessoria afirmou que ele só falaria durante a inauguração desta tarde). O staff é composto pelo superintendente, Hideo Garcia; pelo diretor de esporte Adriano França; pelo diretor de incentivo ao esporte e promoção social Guilherme Schlichta; pelo diretor de lazer Jean Emmanuel Kulchesk; pelo assessor da juventude e paradesporto Helton Stais e pela chefe de gabinete, Adriana de Padua Mello Doering, única mulher.

“Acho que o Poder Público, as instituições, as federações, os clubes precisam investir e precisam ter representatividade. Mas eu acho que, por exemplo, uma representatividade mais importante [que a quadra lilás] é você ter mulheres em cargos decisórios no esporte (…) porque isso vai ter consequências práticas. Outra coisa mais prática que vai ser mais efetiva é você dar verba, você dar estrutura, você investir na modalidade. Acho que isso acabaria resultando em coisas mais positivas”, analisa Haag.

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