Oito anos depois de bater na trave, Marcos Sunye volta a ser candidato

Professor do Departamento de Informática, Sunyê foi candidato a reitor em 2016. Sua vice, Camila Fachin, é médica e atua no HC

Confira abaixo os principais trechos da entrevista com os integrantes da chapa 3, “Movimento UFPR”, que tem Marcos Sunye como candidato a reitor e Camila Fachin como candidata a vice-reitora. Sunye foi candidato em 2016, quando enfrentou o atual reitor, Ricardo Marcelo Fonseca.

Marcos Sunye nasceu em Curitiba e tem 60 anos. Professor titular do Departamento de Informática da UFPR, foi graduado pela instituição e fez mestrado e doutorado na França. Fez concurso para professor da UFPR em 1997 e ajudou a criar o curso de pós-graduação em Informática. Foi chefe de Departamento de Informática e também dirigiu o Centro de Computação Eletrônica da Universidade e o Setor de Ciências Exatas, por oito anos. 

Camila Fachin nasceu em Curitiba e tem 44 anos. Formada em Medicina pela UFPR, atua como cirurgiã pediátrica no Hospital de Clínicas (HC). Mestre e doutora pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). Professora da UFPR desde 2015, exerceu cargos administrativos no HC e atualmente é coordenadora do curso de Medicina da UFPR.

Plural – A eleição tem duas chapas com integrantes da atual gestão, uma delas apoiada pelo reitor. Há espaço para crescer, já que vocês se apresentam como chapa de oposição?

Marcos Sunye – Fui candidato em 2016, bati chapa com o atual reitor e foi a eleição mais apertada da história da universidade. Em 2020 eu me abstive da eleição, estávamos em um contexto de pandemia. Agora fui estimulado a sair, tem um cenário com duas chapas da atual gestão. Esse cenário de duas chapas da situação acabou pressionando muito os grupos que estão insatisfeitos. Tem muita gente insatisfeita com  a atual gestão. A Camila veio para a nossa chapa, é uma grande liderança de oposição no Hospital de Clínicas, a gente uniu essa força. Fazemos o diagnóstico dos problemas. Há a questão das obras, reparos e reformas, é uma reclamação geral. A gente encontrou uma forma de expandir a equipe que faz esses atendimentos, para atender melhor. Tem a política de comunicação da universidade, achamos que ela é ineficiente. É uma comunicação muito “marqueteira”, não é uma comunicação institucional. Isso está gerando problemas de falta de informação da sociedade em relação à universidade. Hoje as pessoas perguntam quanto custa a mensalidade na UFPR. Estamos batendo recordes históricos de baixa procura, isso se dá por falta de informação, as classes D e E desconhecem a vida do estudante, elas não sabem que o estudante pode comer a R$ 1,30 no Restaurante Universitário, que ele tem direito a bolsa permanência, bolsa de iniciação científica. Famílias com fragilidade econômica acabam escolhendo um curso a distância e não vêm para a universidade, estamos com uma crise no preenchimento de vagas. Os campi do interior estão sofrendo muito com vagas públicas que são ofertadas e não são preenchidas. Se a gente continuar com o pé no chão, dizendo o que está sendo feito errado, a gente cresce. É uma oposição propositiva, não é uma oposição destrutiva. 

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Plural – Além desse problemas apontados, que avaliação vocês fazem da atual gestão?

Camila Fachin – Estamos andando por toda a universidade, há muita insatisfação com a atual gestão. A universidade nunca esteve tão burocrática, com uma carga burocrática enorme em cima dos servidores e dos alunos. A universidade nunca teve tão pouco diálogo entre as instâncias. Criou-se um clima em que a crítica à gestão é interpretada como uma crítica à universidade, há uma confusão entre a gestão atual com o que é institucional. A gente precisa despersonalizar isso. Precisamos voltar a ter discussões, discordar, porque a divergência é saudável e deve ser estimulada em uma universidade publica. E hoje a gente vê o contrário, as pessoas buscam o consenso a todo custo, com pouca discussão.

Marcos Sunye e Camila Fachin. Foto: Tami Taketani/Plural

Plural – Entre 2010 e 2019, cerca de 2,7 mil alunos da graduação deixaram a universidade por ano. Como combater a evasão?

Marcos Sunye – Em 2023 foram 7 mil estudantes, pelos dados da Andifes.

Camila Fachin – O crescimento foi de 64% em 2021, quando comparado com 2020. 

Marcos Sunye – É um fenômeno multifatorial, começa com a ausência de moradia estudantil. O número de residências é ridículo em relação ao número de estudantes. São cerca de 40 mil estudantes e tem 150, 200 moradias. No litoral, ainda conseguiam se manter porque a população não fica em Matinhos e Caiobá no inverno. Com o trabalho remoto aumentando e a pandemia, as pessoas estão ficando no litoral, então não existe mais aluguel possível para o estudante em fragilidade econômica. Pagar uma bolsa ou auxílio moradia não é mais suficiente. Para os campus do litoral é uma questão de sobrevivência ter moradia estudantil. Temos que partir para a moradia estudantil. Sabemos que isso não é factível com o orçamento atual, temos que partir para as emendas parlamentares. A articulação política da universidade é inexistente, não se faz nenhuma articulação com a bancada no Legislativo, há pouca conversa com governo estadual e com os governos municipais. Temos a intenção de resgatar esse diálogo institucional, menos ideológico e de valorização da relevância da universidade, para conseguir recursos. 

Camila Fachin – As medidas de permanência estudantil têm um papel muito importante na diminuição da evasão. Um ponto que a gente vai priorizar é a moradia, mas tem vários outros que a gente pode citar. A bolsa permanência hoje está em R$ 600, ainda é pouco para quem precisa. Hoje o RU fecha às 19h30, um aluno que estuda à noite não consegue jantar. O último ônibus intercampi sai do Centro Politécnico às 18h30, o estudante também não consegue transporte. Tudo isso está associado à questão da permanência estudantil. Outro ponto importante é a busca e a prospecção de projetos de pesquisa, para trazer mais fomento para a universidade. Esses projetos podem financiar bolsas para os estudantes. Essas bolsas também são uma forma do estudante permanecer e se sentir parte integrante da universidade. 

Marcos Sunye – Isso acontece no meu Departamento, temos mais de 100 bolsistas, que são pagos com bolsas maiores que as da universidade. Isso tem um impacto muito forte no índice de evasão. Outra coisa que a gente tem que fazer, que a universidade está fazendo muito pouco, é a gestão por evidências. Temos séries históricas do nosso concurso vestibular desde 2003, agora tem um aluno da Pós-Graduação que está começando a fazer a limpeza dos dados para definirmos uma política de entrada, sabermos melhor qual faixa da população nos procura e onde a gente tem que fazer uma comunicação institucional. Essa politica por evidências tem que ser permanente. A universidade está muito acomodada, parece que ainda está nos anos 90, achando que a sociedade tem como única alternativa a UFPR. Essa não é mais a nossa realidade. 

Marcos Sunye. Foto: Tami Taketani/Plural

Plural – O PAC anunciado pelo governo federal prevê R$ 5,5 bilhões para obras. Isso pode dar um fôlego em relação a problemas de infraestrutura? Há muitas obras paradas na atual gestão?

Marcos Sunye – A gestão nunca teve uma estratégia clara de moradia estudantil. A gestão reclama muito que trabalhou com o governo Bolsonaro, mas estamos estamos há dois anos com o governo do PT e as coisas continuam estagnadas. O PAC foi direcionado para obras não terminadas. Mas o próprio Plano Diretor da universidade, que diz onde a universidade quer estar daqui a dez anos, a gente não vê mais em discussão. Essa discussão a gente quer trazer: a universidade que nós queremos daqui a dez anos. Temos hoje um Plano Diretor e na nossa avaliação, menos de 20% das metas definidas foram cumpridas. Queremos que os conselhos superiores da universidade recuperem o papel de direcionar as políticas. Estamos em uma encruzilhada e temos que definir o que a gente quer. 

Camila Fachin – Essa questão da construção versus manutenção é bem importante. Em uma história recente foi priorizada a construção de novos prédios e a manutenção dos já existentes está muito atrasada. A estrutura física no geral está muito ruim. A gente precisa investir primeiro em manutenção das edificações, para daí pensar em construir novos prédios. Coisas básicas como a rede elétrica precisam ter atenção.

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Plural – O orçamento teve um corte e uma recomposição neste ano, mas ainda está longe do ideal e a maior parte é destinada à folha de pagamentos. Como trabalhar nesse cenário?

Marcos Sunye – Fui relator do orçamento da universidade em 2016. O que sobrava depois do pagamento de pessoal e de pagamentos obrigatórios era acima dos R$ 200 milhões. Em 2024, está em R$ 173 milhões. Caiu em números absolutos. Se for contar a inflação, teve uma redução entre 40% e 50%. Já falamos sobre as emendas, não teve nenhum trabalho institucional com os deputados. Algumas universidades têm um escritório em Brasília para fazer esse contato com o Legislativo, a gente pretende resgatar isso. Nosso Departamento capta R$ 60 milhões ano. Recursos podem vir do Ministério da Saúde, que tem a Fundação Nacional da Saúde, do MEC e do Ministério da Justiça, que tem o Fundo Nacional de Segurança Pública. O Ministério da Saúde usa o fundo para projetos de pesquisa, dentro desses projetos sobram recursos para reformar laboratórios. Essa captação tem sido feita individualmente por pesquisadores. Queremos fazer isso institucionalmente. 

Camila Fachin. Foto: Tami Taketani/Plural

Plural – Um dos temas da campanha tem sido a burocracia interna e a necessidade de adaptação dos sistemas. Como vocês avaliam?

Marcos Sunye – Tem cargos importantes dentro de uma administração de sistemas de informação que não estão nem na carreira. No Judiciário tem esse tipo de cargo, no Executivo não. Existe uma solução jurídica, tornar a informática uma ação estratégica, aí conseguimos jogar recursos e ampliar a equipe. A questão é priorizar, fazer um planejamento estratégico. Hoje tem muita tecnologia para preenchimento automático de formulários, isso vai angustiando as pessoas, que veem uma parafernália tecnológica para diminuir o trabalho repetitivo. A equipe de desenvolvedores está fazendo o que consegue, mas é muito centralizado. Isso acaba reproduzindo como está funcionando a universidade hoje: ela é muito centralizada, o poder decisório está muito concentrado no gabinete do reitor, que às vezes toma uma decisão com a melhor das boas intenções, mas não é uma decisão adequada para o conjunto. Vamos discutir com a equipe toda. 

Plural – Houve algum avanço em relação a isso nessa gestão?

Marcos Sunye – Piorou bastante, até pelo perfil da gestão do reitor. Fala-se muito em segurança jurídica, não se discute mais a relevância de uma determinada regra do governo federal, mas a segurança jurídica. A gente tem conversar com o TCU, ele incentiva que a universidade exerça sua autonomia. O que os auditores querem saber é o número de pessoas beneficiadas e se há algum desvio do padrão das outras universidades. Esses benefícios devem ser olhados por essa ótica. Podemos ter uma resolução própria e aplicar essa autonomia. A universidade não é uma repartição publica padrão, como é um ministério. 

Camila Fachin – A gente sempre tem buscado soluções concretas e muito do que é feito em outras universidade federais. Existe uma forma menos burocrática de fazer em outras universidades, a gente quer trazer isso para a UFPR.

Plural – Essa gestão parece ter priorizado a inclusão e há críticas a um certo desequilíbrio em relação a outras áreas. Houve isso?

Marcos Sunye – Não dá para fazer uma inferência de que o aumento na inclusão implique no declínio da pesquisa. Sinto falta de uma gestão por evidências, trabalhar os dados reais. Essa série histórica de 2003, com as cotas, que nenhuma outra universidade tem. nós avaliamos muito pouco. Não acredito nesse discurso de que uma coisa se opõe à outra. A gente tem que tratar inclusão e principalmente a permanência.

Camila Fachin – A gente teve iniciativa boas, como a criação da Superintendência de Inclusão, Políticas Afirmativas e Diversidade (Sipad), mas a atuação ficou muito restrita. A UFSC criou uma pró-reitoria de políticas afirmativas. Temos que ampliar, na forma de ampliação de recursos humanos e financeiros, ou caminhando para ter uma pró-reitoria. Depois de 20 anos de políticas afirmativas de entrada, a gente consegue colocar os alunos, mas eles são os que mais evadem. A universidade não dá ferramentas para ele continuar.

Plural – Há uma falha de comunicação da universidade? Como trabalhar isso?

Marcos Sunye – A melhor proposta é a da UFMG, que tem uma resolução própria definindo a política de comunicação. Eles trabalham a política institucional dissociada da Reitora. Não é propaganda da gestão. Essa comunicação tem que ser multicampi, não é a mesma coisa comunicar com Palotina e com Jandaia. A gente não comunica como é a vida acadêmica, tem poucas reportagens sobre como é o dia a dia do estudante, que oportunidades a universidade dá para ele. Outro ponto é o HC, ele tem uma equipe muito pequena de comunicação, que não está integrada com a universidade. 

Camila Fachin – Existe uma ciência de como divulgar a ciência para não cientistas. A gente tem pesquisadores que publicam sobre isso e pode aproveitar essas inteligências. A extensão é uma grande interface com a sociedade. É uma determinação do governo federal, todos os cursos têm que ter 10% da carga horária voltada para a extensão. Só que a gente precisa dar incentivo institucional para a extensão, porque o tripé está meio manco. A bolsa é menor, a duração é menor e o fomento para a extensão é menor.

Plural – O governo passado atacou as universidades federais, inclusive com cortes orçamentários. Como vocês avaliam esse risco, que ainda existe?

Camila Fachin – O mais importante é estar ciente desse risco e ter uma Reitoria imbuída em preservar a universidade pública e gratuita. A universidade precisa buscar novas formas de trazer fomento, de estimular os alunos, diminuir a evasão e melhorar a procura, para a própria sobrevivência da universidade pública. O mais importante é ter uma Reitoria que entende essa ameça e está comprometida com a universidade pública.

Marcos Sunye – Do ponto de vista administrativo, a universidade é muito conservadora, lenta para mudar. Tem várias iniciativas do governo federal no sentido de desburocratizar a gestão da ciência e tecnologia, aplicamos mal o marco legal. A gente trabalha mal a questão da internacionalização da universidade. O que segurou muito o Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) quando ele foi atacado foram as relações internacionais do instituto. Essa projeção traz segurança. Uma das nossas propostas é de democracia participativa, estamos usando um software feito pela prefeitura de Barcelona, as pessoas podem fazer uma reunião aberta e as propostas são colhidas. Isso traz um envolvimento maior da comunidade e já estamos usando na campanha. Tira um pouco do comodismo. Do jeito como a universidade está, a gente fica muito frágil aos ataques externos. 

Plural – Fora da vida acadêmica, o que vocês fazem nas horas vagas?

Marcos Sunye – Eu jogo tênis desde o juvenil e hoje me ajuda muito a extravasar, manter a forma física e colocar as ideias em ordem.

Camila Fachin – Eu ando com os cachorros e cuido do filho. Faço caminhadas, gosto andar de bicicleta com meu filho e curtir a família nos períodos livres.

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