Indígenas do Oeste do Paraná são encurralados por agrotóxicos, denunciam entidades à ONU

76% das propriedades rurais que cercam ou avançam sobre a Terra Indígena Tekoha Guasu Guavirá utilizam agrotóxicos, entre eles o glifosato

Agrotóxicos são usados por 76% das propriedades rurais que cercam e avançam sobre a Terra Indígena Tekoha Guasu Guavirá, nos municípios de Guaíra e Terra Roxa, no Oeste do Paraná. A situação do povo Avá-Guarani, que vem sendo confinado a uma área cada vez menor, será denunciada nesta quarta-feira (18) por entidades sul-americanas ao relator especial sobre substâncias tóxicas e direitos humanos da Organização das Nações Unidades (ONU), Marcos Orellana, em Genebra, na Suíça. 

Um dos principais agrotóxicos usados na região é o glifosato, que tem um grande potencial tóxico e é utilizado no cultivo de soja transgênica. Em abril, sete entidades denunciaram a multinacional Bayer à Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE), por produzir e comercializar no Brasil um produto que já foi banido da União Europeia. Na denúncia, as organizações afirmam que a Bayer promove na América do Sul um modelo agrícola que gera escassez de água, insegurança alimentar, perda de biodiversidade, desmatamento, graves consequências para a saúde e conflitos por terras. A denúncia ainda não foi aceita pela OCDE. 

Uma das entidades que assinam as denúncias é a brasileira Terra de Direitos, que fez um levantamento sobre o uso de agrotóxicos na região Oeste do Paraná, onde predominam as culturas de soja e milho. Em Terra Roxa, 921 das 1.209 propriedades relataram usar agrotóxicos; em Guaíra, 509 de 661 propriedades admitiram o uso.

“O uso intensivo de agrotóxicos contaminou rios, alimentos, animais e povos indígenas. Os pesticidas são até usados como arma química para confinar os povos indígenas a uma faixa de terra cada vez menor. Dependentes de rios e nascentes para acesso à água, as aldeias relatam doenças frequentes como vômitos, dores de cabeça, abortos espontâneos, dificuldade para respirar, entre outras, principalmente entre idosos e crianças”, diz a denúncia da entidade à ONU. “Existem áreas fumigadas com agrotóxicos próximas às casas ou estradas indígenas. Em testes laboratoriais, foi verificada a presença do Glifosato e de seu principal metabólito, o ácido aminometilfosfônico (AMPA), em mananciais das aldeias Y’Hovy, Pohã Renda e Ocoy”.

Chamados de “índios paraguaios” por Ratinho Jr, indígenas têm direito a permanecer em territórios no Oeste, decide TRF4

Além disso, o uso do glifosato também seria responsável por atingir a fauna da região, com o desaparecimento de espécies silvestres de pássaros, abelhas, borboletas e animais de caça e a diminuição do número de peixes nos rios. Só em 2022, segundo a Terra de Direitos, foram comercializadas 31.270 toneladas de glifosato no Paraná. Também assinam a denúncia as entidades Centro de Estudios Legales y Sociales (Argentina), BASE-IS (Paraguai), Fundación Tierra (Bolívia) e as alemãs Misereor e ECCHR.

Impasse

A Terra Indígena Tekoha Guasu Guavirá foi reconhecida em 2018 pela Funai, mas o processo de demarcação foi suspenso em 2020. No início de agosto, o governador Ratinho Júnior (PSD) chamou os indígenas da região de “índios paraguaios” e ameaçou usar forças policias para desocupar áreas reivindicadas por produtores rurais. Os fazendeiros recorreram à Justiça e obtiveram decisões favoráveis à reintegração de posse, que foram suspensas pelo desembargador federal Luiz Antonio Bonat, do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4). Bonat reconheceu que a Terra Indígena foi definida em 2018 e determinou que os indígenas tenham acesso a atendimento de saúde. O governo federal enviou a Força Nacional para a região.

A Terra Indígena Tekoha Guasu Guavirá ocupa 5,83% do território do município de Altônia (1,4 mil hectares), 34,4% de Guaíra (82 mil hectares) e 59,5% dos limites de Terra Roxa (14,2 mil hectares). O despacho que reconheceu a área como Território Indígena é do dia 15 de outubro de 2018.

Recorde de pesticidas

Segundo dados do Ministério da Saúde, entre 2007 e 2015 foram registrados 84.206 casos de intoxicação por agrotóxicos no país. Só em 2022, estados e a União deixaram de arrecadar um total de R$ 12,9 bilhões com a isenção fiscal dada a determinados pesticidas, de acordo com a Abrasco (Associação Brasileira de Saúde Coletiva). No mesmo ano, produtores brasileiros utilizaram cerca de 800 mil toneladas, mais que a quantia somada de China e Estados Unidos, de acordo com dados da FAO/ONU.

O recorde na liberação de agrotóxicos foi batido durante o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro: foram 2.178 liberações. Em segundo lugar aparece o governo de Michel Temer, com 1.130 liberações. De 2023 a agosto deste ano, o governo de Luiz Inácio Lula da Silva já liberou a utilização de 883 novos pesticidas no país.

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